A Emoção como Pilar da Aprendizagem e do Desenvolvimento Humano

Como as emoções influenciam profundamente a cognição, a socialização e a aprendizagem ao longo da vida.

A Emoção como Pilar da Aprendizagem e do Desenvolvimento Humano

As emoções representam uma dimensão fundamental da experiência humana, influenciando profundamente nossos comportamentos, decisões, relações sociais e, sobretudo, os processos de aprendizagem. Durante muito tempo, a ciência tratou a emoção e a razão como polos opostos e excludentes, desconsiderando sua interação essencial. Contudo, com o avanço da psicologia evolucionista e das neurociências, tornou-se evidente que emoção e cognição estão intimamente ligadas, funcionando como sistemas interdependentes no cérebro humano (Damásio, 2012; Morais, 2020). Damásio (2013) afirma que as emoções são adaptações evolutivas essenciais para a sobrevivência da espécie humana, integrando a resposta a estímulos ambientais com mecanismos de avaliação e ação. Essa perspectiva desloca a emoção de um simples sentimento subjetivo para uma função orgânica, reguladora e indispensável, inclusive na aprendizagem.

Na infância, as emoções desempenham um papel ainda mais crítico, uma vez que a criança está em formação psíquica, social e biológica. Como apontam Lipp (2002) e Bee (2011), o estresse infantil pode causar prejuízos severos no desenvolvimento emocional e cognitivo, resultando em baixa autoestima, transtornos de comportamento e dificuldades de aprendizagem. Quando o organismo infantil é submetido a estressores intensos e contínuos, ocorre uma sobrecarga fisiológica que compromete o equilíbrio do sistema nervoso e do sistema endócrino, impactando diretamente regiões cerebrais como o hipotálamo e o hipocampo, estruturas envolvidas no processamento da memória e das emoções (Myers, 2009). Isso evidencia que a aprendizagem não pode ser dissociada do estado emocional do indivíduo, pois é justamente a emoção que mobiliza os recursos da atenção, percepção e memória, funções cognitivas essenciais ao aprender (Crismarie Hackenberg, 2020).

O modelo das emoções básicas, desenvolvido por autores como Ekman (1993) e Izard (2007), propõe que emoções como medo, raiva, alegria, tristeza, surpresa e nojo são universais, inatas e possuem padrões fisiológicos distintos, sendo compartilhadas até mesmo com outros primatas. Essas emoções exercem funções adaptativas específicas e são ativadas automaticamente em resposta a estímulos ambientais. Já as emoções secundárias, como a vergonha, o orgulho e a empatia, são construções sociais e culturais, emergindo de processos de aprendizagem e de mediação simbólica, conforme destaca Vygotsky (2004). A presença das emoções secundárias é especialmente significativa para o processo de regulação emocional, uma habilidade crítica no desenvolvimento de competências sociais e emocionais mais complexas.

Dentro dessa perspectiva, Goleman (2011) desenvolveu o conceito de inteligência emocional, definindo-a como a capacidade de reconhecer, entender e gerenciar as próprias emoções, assim como compreender as emoções dos outros. Para ele, essa competência se organiza em cinco pilares: o autoconhecimento emocional, o controle das emoções, a automotivação, a empatia e as habilidades sociais. Esses pilares não apenas favorecem o equilíbrio emocional, mas também se revelam essenciais para a construção de relações interpessoais saudáveis, a tomada de decisões conscientes e o desempenho acadêmico e profissional. A ausência dessa regulação emocional pode levar à impulsividade, ao arrependimento e à dificuldade de adaptação social, conforme evidencia a abordagem de Antunes (2010).

As emoções são também fenômenos sociais. Desde muito cedo, aprendemos a reconhecer e expressar emoções em contextos sociais específicos, sobretudo no ambiente familiar e escolar. Reeve (2006) e Fischer e Manstead (2010) destacam funções sociais das emoções, como a afiliação, o contágio emocional, o distanciamento social e a comunicação interpessoal. A afiliação emocional fortalece laços sociais e promove cooperação, enquanto o contágio emocional evidencia como as emoções são compartilhadas e replicadas entre indivíduos, moldando comportamentos coletivos. Essa dimensão social é particularmente visível na escola, onde crianças constroem competências emocionais por meio da linguagem, do convívio com o outro e da mediação de adultos emocionalmente competentes.

A competência emocional, como define Saarni (2011), é a habilidade de responder adequadamente às demandas emocionais do ambiente, reconhecendo e regulando as próprias emoções e as dos outros. Essa competência se desenvolve desde a infância e está intrinsecamente relacionada ao desenvolvimento de habilidades sociais e cognitivas. A linguagem, por exemplo, é uma das ferramentas mais poderosas para a socialização das emoções, pois permite que o indivíduo nomeie o que sente, compartilhe suas experiências e busque apoio emocional. Assim, a competência emocional contribui para a competência social, que é a capacidade de estabelecer e manter relações interpessoais eficazes e adaptativas (Berkovits & Baker, 2014).

No campo da aprendizagem, a neuropsicopedagogia e os princípios do Desenho Universal para a Aprendizagem (DUA) têm ressaltado a necessidade de considerar a emoção como um dos pilares da prática educacional. As redes de conhecimento, estratégias e redes afetivas descritas por Morais (2020) mostram como diferentes vias neurais são ativadas conforme a experiência emocional do aluno. O envolvimento afetivo com o conteúdo, por exemplo, aumenta significativamente a retenção da informação e a motivação para o aprendizado. Duckworth (2007), em sua pesquisa sobre sucesso acadêmico, identificou que a persistência, e não o quociente de inteligência, é o principal fator de distinção entre alunos bem-sucedidos e aqueles com baixo desempenho, o que reforça a importância das emoções no engajamento e na autorregulação.

A regulação emocional, nesse contexto, é entendida como a capacidade de modular a intensidade e a duração das emoções com o objetivo de alcançar metas e promover o bem-estar. Segundo Gazzaniga et al. (2018), a ativação de diferentes emoções acarreta respostas fisiológicas específicas no corpo humano, como sudorese, aceleração dos batimentos cardíacos e alterações na expressão facial. Essas manifestações físicas não apenas sinalizam a presença de uma emoção, mas também influenciam a maneira como os outros nos percebem e reagem a nós, o que tem implicações diretas nas interações sociais e no ambiente educacional.

Conforme aponta a teoria da avaliação, uma emoção é desencadeada a partir da interpretação subjetiva que fazemos de um estímulo, seja ele interno ou externo. Essa interpretação ativa uma resposta emocional que pode ser regulada com base em fatores como experiências prévias, contexto sociocultural e capacidade cognitiva (Crismarie Hackenberg, 2020). Assim, uma mesma situação pode evocar respostas emocionais distintas em indivíduos diferentes, conforme suas vivências e estruturas de personalidade. Tal compreensão é essencial para a atuação de educadores, psicopedagogos e demais profissionais da educação, pois permite a construção de ambientes acolhedores e propícios ao desenvolvimento integral dos alunos.

Dessa forma, ao integrar os saberes da psicologia, da neurociência, da pedagogia e da sociologia, o estudo das emoções revela-se não apenas pertinente, mas indispensável para compreender a complexidade da natureza humana. A emoção não é apenas um adorno subjetivo da racionalidade, mas um agente organizador do pensamento, da ação e da aprendizagem. Compreender suas origens, suas funções e seus impactos nos processos sociais, cognitivos e afetivos é um passo fundamental para a promoção de práticas educacionais e relacionais mais humanas, conscientes e transformadoras.

Referências

ANTUNES, Celso. Inteligência emocional e educação. 2. ed. Petrópolis: Vozes, 2010.

BEE, Helen. Desenvolvimento humano. 10. ed. Porto Alegre: Artmed, 2011.

BERKOVITS, Shira M.; BAKER, Bruce L. Predicting the quality of sibling interactions: The role of emotion regulation and social competence. Journal of Applied Developmental Psychology, v. 35, n. 5, p. 394–402, 2014.

CRISMARIE, Hackenberg. As emoções e o cérebro: como o emocional interfere no aprender. São Paulo: Autêntica, 2020.

DAMÁSIO, Antonio R. O erro de Descartes: emoção, razão e o cérebro humano. 2. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2012.

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DUCKWORTH, Angela. Garra: o poder da paixão e da perseverança. Rio de Janeiro: Objetiva, 2007.

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FISCHER, Agneta H.; MANSTEAD, Antony S. R. Social functions of emotion. In: SNYDER, C. R.; LOPEZ, Shane J. (Orgs.). Oxford Handbook of Positive Psychology. 2. ed. New York: Oxford University Press, 2010. p. 212–226.

GAZZANIGA, Michael S. et al. Neurociência cognitiva: a biologia da mente. 5. ed. Porto Alegre: AMGH, 2018.

GOLEMAN, Daniel. Inteligência emocional: a teoria revolucionária que redefine o que é ser inteligente. 2. ed. Rio de Janeiro: Objetiva, 2011.

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LIPP, Marilda E. N. Estresse infantil: causas e consequências. Campinas: Papirus, 2002.

MORAIS, Regina C. Neuropsicopedagogia e inclusão: contribuições das neurociências para a aprendizagem. 2. ed. Curitiba: Appris, 2020.

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VYGOTSKY, Lev S. A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos psicológicos superiores. São Paulo: Martins Fontes, 2004.