Um dia após meu suicídio

Às vezes, é preciso um pesadelo para perceber o quanto somos amados e o valor de continuar vivendo.

Um dia após meu suicídio

Um dia após o meu suicídio, tudo aquilo que eu acreditava ser verdade desmoronou diante dos meus olhos. Lá estava a minha esposa, no chão do nosso quarto, abraçada à minha camisa suja de sangue, com nossas fotos espalhadas ao redor. Eu sempre achei que ela não me amava mais, que a rotina tinha nos afastado, mas ali, no meio do pranto e do desespero, o amor dela se revelou de uma forma que eu nunca enxerguei. Como pude não perceber antes?  

Um dia após o meu suicídio, os meus filhos estavam no quarto, perdidos e confusos, sem entender o que havia acontecido. Entre lágrimas e abraços apertados, eles perguntavam por que eu não tinha falado com eles, por que eu não havia pedido ajuda. Vi neles o reflexo do amor mais puro e verdadeiro, o amor que só os filhos podem nos dar, mesmo quando nos sentimos vazios. Eles ainda precisavam de mim. Ainda havia muito para ensinar, compartilhar e viver com eles. Eu era o mundo deles, e eles eram o meu — mas eu não enxergava mais.

Um dia após o meu suicídio, o Max, meu fiel cachorro, mostrou o quanto o amor é incondicional. Todas as vezes que escutava o barulho de um carro entrando na garagem, ele corria animado, acreditando que era eu. Quando percebia que não era, ele deitava-se em frente à porta, triste, mas esperançoso. Eu nunca reparei antes no olhar dele, naquela expectativa pura, naquele amor simples e leal que só os animais conseguem oferecer. O Max estava ali todos os dias, à espera de mim — mas eu é que havia desistido dele.  

Um dia após o meu suicídio, os meus irmãos, aqueles com quem tantas vezes discuti por coisas pequenas, estavam sentados na sala, com os olhos vermelhos de tanto chorar. Eles se lembravam de quando éramos crianças, das brincadeiras, das aventuras no quintal, das risadas. E eu, que me sentia tão sozinho, percebi que, na verdade, sempre tive a companhia deles, mesmo que a vida adulta tenha nos distanciado. Eles falavam de mim com saudade, com carinho, e vi o quanto a minha presença ainda era importante para eles.  

Um dia após o meu suicídio, os meus pais vieram à minha mente. Mesmo depois de tanto tempo desde que partiram, era como se eu os pudesse sentir ali, me olhando, me abraçando em silêncio. Senti saudade do colo de minha mãe, do jeito sério do meu pai. Não sei se era imaginação ou algo mais profundo, mas eu senti amor. Um amor que nunca me deixou, nem mesmo depois que eles se foram. Naquele momento, percebi que o tempo nunca apaga a conexão com aqueles que nos amaram de verdade.  

Um dia após o meu suicídio, vi um grande amigo, aquele que tantas vezes recusou os meus convites, que dizia estar ocupado demais. Agora, ele estava ali, revendo as nossas fotos, chorando por todos os momentos que ele deixou passar. Ele repetia: "Por que não fiz mais? Por que não estive mais presente?" Naquele instante, eu percebi que, mesmo quando o silêncio parecia me cercar, havia pessoas que se importavam comigo.  

Mais tarde, fui até a morgue. Vi o meu corpo ali, inerte, sem vida. O rosto pálido, os sonhos interrompidos. Tantos planos que ficaram pelo caminho. Tantos lugares para conhecer, tantas histórias para viver. Ali, olhando para mim mesmo, eu quis gritar: "Por que desistiu? Quantas pessoas te amavam, mesmo que você não visse? Por que deixou que a dor te vencesse?"  

Foi então que acordei. Tudo aquilo tinha sido apenas um pesadelo, um aviso. Eu ainda estava aqui. A vida ainda estava aqui, com todas as suas dificuldades, mas também com todas as suas possibilidades. Aquelas pessoas que eu vi chorando ainda estão comigo. Minha esposa ainda me ama, meus filhos ainda precisam de mim, meus irmãos ainda compartilham comigo as melhores memórias, e os meus amigos ainda querem ouvir a minha voz. 

A dor da alma é invisível, silenciosa, difícil de explicar. Não se cura com remédios em cápsulas. Ela precisa de abraços apertados, de palavras de conforto, de um olhar que diz: "Eu estou aqui para você." É difícil, sim, encontrar quem esteja disposto a nos "medicar" dessa forma, mas essas pessoas existem. E, às vezes, o primeiro passo é nosso: pedir ajuda, deixar que alguém entre, abrir o coração.  

Se você, assim como eu, sente que a vida é insuportável, que a dor é grande demais, respire fundo. Tente mais uma vez. Apenas mais uma. Você não precisa enfrentar isso sozinho. Procure alguém: um amigo, um familiar, um profissional. Permita-se acreditar que as coisas podem melhorar.  

A vida pode ser dura, mas ela também é feita de momentos que valem a pena: um abraço sincero, uma gargalhada inesperada, uma manhã ensolarada. Enquanto ainda estamos aqui, existe tempo para amar, para recomeçar, para viver.  

Dê uma chance. Às pessoas, à vida, a si mesmo. Vai ficar tudo bem. As cicatrizes de hoje serão, um dia, a prova de que você venceu. Porque você vai vencer. Você não está sozinho. E nunca esteve.