O Juramento Esquecido: quando a advocacia se curva à ideologia

A defesa da Constituição e do devido processo não pode ser seletiva nem submetida ao ódio político.

O Juramento Esquecido: quando a advocacia se curva à ideologia

Vivemos um tempo em que a omissão e o aplauso fácil diante de violações graves à Constituição se tornaram um triste retrato do Brasil. Como operador do direito e jornalista, não posso me calar diante daquilo que assisto: a relativização do juramento que todos os profissionais do Direito um dia fizeram e que, hoje, parece ter sido sequestrado pela paixão ideológica.

Ao jurarmos pela Ordem dos Advogados do Brasil, assumimos um compromisso: defender a Constituição, o Estado Democrático de Direito, os direitos humanos, a justiça social e a dignidade das instituições. Não se trata de defender partidos, ideologias ou líderes específicos. Trata-se de defender aquilo que é universal: a legalidade, o devido processo e a imparcialidade da Justiça.

No entanto, o que vemos é uma postura seletiva. Muitos que, em suas bancas, batalham por nulidades processuais em favor de homicidas, estupradores e assaltantes, parecem achar razoável quando garantias mínimas são negadas a quem rotulam como adversário político. Isso não é coerência jurídica, tampouco ética; é a rendição da advocacia ao ódio e ao facciosismo.

O pluralismo político, princípio fundamental previsto no artigo 1º da Constituição, é o que assegura que diferentes correntes ideológicas coexistam em uma democracia. Quando esse pluralismo é sufocado, quando o contraditório é criminalizado, deixamos de viver sob um regime democrático e passamos a conviver com uma ordem de perseguição. O jurista que aplaude essa inversão abre mão da sua missão e se torna cúmplice de um processo de erosão das liberdades.

Lembro, ainda, que a imunidade parlamentar prevista no artigo 53 da Carta Magna não é uma concessão pessoal, mas uma salvaguarda da democracia. Deputados e senadores são invioláveis por suas opiniões, palavras e votos. Rasgar esse preceito é rasgar a essência do sistema representativo. Quem aceita calado que se persiga um parlamentar por suas palavras, consente em que amanhã qualquer cidadão seja perseguido pelo que diz.

A liberdade de expressão é o verdadeiro termômetro da democracia. O lado que censura demonstra medo da luz, receio do debate e incapacidade de sustentar argumentos. E quando a Justiça se transforma em instrumento político, não estamos mais diante de um Estado de Direito, mas de um projeto autoritário.

Diante disso, faço uma convocação moral: não é necessário amar Bolsonaro ou qualquer outro personagem político para defender a legalidade. É necessário apenas honrar o compromisso que juramos diante da OAB e que está inscrito em nossa consciência de juristas. Ignorar isso é negar a própria identidade profissional.

Como cristão, reforço que a nossa vida terrena é passageira e que nenhuma estrutura de poder é eterna. A fatura da história sempre chega. E, mais cedo ou mais tarde, cada um de nós será chamado a responder, não apenas perante os tribunais humanos, mas diante da justiça divina.

A liberdade no Brasil já se encontra severamente limitada. Mas há algo que ainda não conseguiram sequestrar: a capacidade de pensar. Este é o último reduto da verdadeira resistência. E é nele que devemos nos agarrar, se quisermos ainda ter futuro como sociedade livre e democrática.