Bolsonaro critica Alexandre de Moraes após indiciamento pela PF por suposto envolvimento em plano de golpe de Estado

Jair Bolsonaro foi indiciado pela Polícia Federal, junto com 36 pessoas, por suspeita de planejar um golpe de Estado após a eleição de Lula, gerando críticas ao ministro Alexandre de Moraes e intensos debates sobre polarização, devido processo legal e separação de Poderes previstos na Constituição.

Bolsonaro critica Alexandre de Moraes após indiciamento pela PF por suposto envolvimento em plano de golpe de Estado

O ex-presidente Jair Bolsonaro se pronunciou nesta quinta-feira (21/11) após ser indiciado pela Polícia Federal (PF) por suspeita de envolvimento em um plano de golpe de Estado após a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva em 2022. Em entrevista por telefone ao jornalista Paulo Cappelli, colunista da revista Metrópoles, Bolsonaro concentrou suas críticas no ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), relator do inquérito que investiga atos antidemocráticos. 

“O ministro Alexandre de Moraes conduz todo o inquérito, ajusta depoimentos, prende sem denúncia, faz pesca probatória e tem uma assessoria bastante criativa. Faz tudo o que não diz a lei”, declarou Bolsonaro, apontando o que considera uma condução irregular do processo. Ele também afirmou que aguardará os próximos passos judiciais antes de tomar uma posição mais definida. “Tem que ver o que tem nesse indiciamento da PF. Vou esperar o advogado. Isso, obviamente, vai para a Procuradoria-Geral da República. É na PGR que começa a luta. Não posso esperar nada de uma equipe que usa a criatividade para me denunciar”, concluiu.

Indiciamento e operação policial

A Polícia Federal indiciou o ex-presidente Jair Bolsonaro e outros 36 investigados, incluindo seis militares, por suposto envolvimento em ações destinadas a desestabilizar o governo eleito e atacar as bases das instituições democráticas do Brasil. Como parte das investigações, uma operação realizada pela PF em 20 de novembro levou à prisão de seis militares, acusados de planejar o assassinato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). Segundo o inquérito, um dos militares teria chegado às proximidades da residência de Moraes com o objetivo de detê-lo, configurando uma grave ameaça à integridade do magistrado.

Apesar da gravidade das acusações, a condução de Alexandre de Moraes neste processo tem levantado questionamentos quanto à sua constitucionalidade. A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5º, inciso LIV, estabelece que "ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal". No entanto, há indícios de que as decisões de Moraes, que incluem prisões preventivas, bloqueio de contas bancárias e quebra de sigilos, foram tomadas de forma monocrática e sem observância plena das garantias processuais, caracterizando um possível abuso de autoridade.

Além disso, a separação dos poderes, garantida pelo artigo 2º da Constituição, estabelece que Legislativo, Executivo e Judiciário são independentes e harmônicos entre si. Ao centralizar investigações e determinar ações judiciais que extrapolam sua competência jurisdicional, Moraes teria ultrapassado os limites do devido processo, agindo como acusador, investigador e julgador ao mesmo tempo. Essa atuação contraria os princípios do juiz natural (artigo 5º, inciso LIII) e da imparcialidade judicial, pilares fundamentais do Estado Democrático de Direito.

As investigações da PF revelam um contexto de suposta conspiração contra líderes das instituições democráticas, mas a condução do caso por Moraes, com medidas duras tomadas sem a devida colegialidade do Supremo Tribunal Federal, abre precedentes perigosos. O artigo 129 da Constituição atribui ao Ministério Público a função exclusiva de promover investigações e ações penais, enquanto o papel do Judiciário é o de garantir o equilíbrio e a imparcialidade nos julgamentos. A invasão de competências por Moraes viola esse princípio, enfraquecendo o sistema de freios e contrapesos que sustenta o Estado Democrático.

Os desdobramentos deste caso, embora importantes para a estabilidade democrática, não devem justificar a violação de direitos e garantias fundamentais previstas na Constituição. A busca pela responsabilização dos envolvidos em atos antidemocráticos deve ocorrer dentro dos limites constitucionais, evitando que práticas abusivas comprometam a legitimidade das decisões judiciais e alimentem a polarização política.

Portanto, a atuação de Alexandre de Moraes, ao afastar-se dos limites constitucionais em nome da estabilidade institucional, revela uma contradição que ameaça o próprio fundamento do Estado de Direito. A legitimidade das instituições depende de sua conformidade com a Constituição, e qualquer desvio, mesmo que justificado pela gravidade dos fatos, deve ser analisado com rigor, sob pena de abrir caminho para a arbitrariedade.

Contexto da “criatividade”

Durante sua manifestação, Jair Bolsonaro criticou o uso do termo "criatividade", associando-o ao que considera uma condução politizada e arbitrária do inquérito em que é investigado. A menção se refere a uma troca de mensagens entre Airton Vieira, juiz instrutor do gabinete de Alexandre de Moraes, e Eduardo Tagliaferro, então chefe da Assessoria Especial de Enfrentamento à Desinformação do Tribunal Superior Eleitoral. Na conversa, Vieira teria sugerido a Tagliaferro que "usasse sua criatividade rsrsrs" para superar dificuldades na formalização de uma denúncia contra a revista Oeste. Bolsonaro apresentou essa correspondência como indicativo de um suposto desvio de imparcialidade, sugerindo que o inquérito é conduzido com base em métodos subjetivos, afastados de fundamentos legais sólidos.

A troca de mensagens, se confirmada, pode configurar um desrespeito aos princípios constitucionais que regem a atuação do Poder Judiciário, em especial o dever de imparcialidade. De acordo com o artigo 5º, inciso LIII, da Constituição Federal, "ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente". No entanto, o diálogo divulgado por Bolsonaro levanta dúvidas sobre a conduta dos responsáveis pela investigação, sugerindo uma atuação que pode extrapolar os limites do devido processo legal, garantido pelo artigo 5º, inciso LIV.

A expressão "usar a criatividade" em um contexto de formalização de denúncia contra um órgão de imprensa suscita preocupações quanto à violação da liberdade de expressão e da imprensa, protegida pelo artigo 5º, inciso IX, que assegura a livre manifestação de pensamento, vedado o anonimato. Além disso, o artigo 220 da Constituição estabelece que a manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo, não sofrerão qualquer restrição, salvo nos casos previstos pela própria Constituição. A tentativa de "encontrar meios criativos" para justificar acusações pode, portanto, ser interpretada como uma afronta a essas garantias constitucionais.

Bolsonaro argumentou que o episódio reflete uma prática de "pesca probatória", em que autoridades buscam elementos incriminadores de forma questionável, indicando um viés nas investigações e um desrespeito ao princípio da imparcialidade judicial. Este princípio, consagrado no artigo 8º da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica), da qual o Brasil é signatário, reforça que toda pessoa tem direito a um processo conduzido por um tribunal imparcial e independente.

O uso do termo "criatividade", como apresentado, também pode ser visto como um desvio das atribuições constitucionais do Poder Judiciário, ao sugerir uma conduta que compromete a confiança na atuação isenta das autoridades. A Constituição Federal, em seu artigo 2º, estabelece que os Poderes da República são independentes e harmônicos entre si. A politização de investigações e julgamentos, se confirmada, enfraquece o equilíbrio entre os Poderes e compromete o Estado Democrático de Direito.

Portanto, a manifestação de Bolsonaro coloca em evidência possíveis violações aos princípios constitucionais que devem orientar investigações e julgamentos no Brasil. Qualquer desvio de imparcialidade, abuso de autoridade ou tentativa de instrumentalizar a justiça para fins políticos não apenas afronta a Constituição, mas também compromete a legitimidade das instituições democráticas.

Implicações e próximos passos

O indiciamento do ex-presidente Jair Bolsonaro e de outros 36 investigados será submetido à análise da Procuradoria-Geral da República (PGR), que decidirá se oferecerá denúncia formal ao Supremo Tribunal Federal (STF). A defesa de Bolsonaro aguarda acesso ao relatório completo da Polícia Federal (PF) para delinear sua estratégia jurídica. Os advogados do ex-presidente têm argumentado sobre possíveis irregularidades na condução do inquérito e alegam que a investigação extrapola os limites constitucionais.

O caso já provoca intenso debate no campo jurídico e político, com possíveis repercussões no cenário institucional brasileiro. A investigação, que inclui graves acusações como planejamento de atos violentos e tentativa de golpe de Estado, acirra divisões entre os Poderes da República. Esse contexto ressalta a tensão entre o STF e setores conservadores da política nacional, alimentando uma polarização que marcou profundamente o período pós-eleitoral de 2022.

Do ponto de vista constitucional, a situação levanta questionamentos sobre princípios fundamentais, como o devido processo legal (art. 5º, LIV, da Constituição Federal), o direito à ampla defesa e ao contraditório (art. 5º, LV). A crítica de Bolsonaro e seus aliados é de que o inquérito conduzido pelo ministro Alexandre de Moraes teria avançado de forma unilateral, desrespeitando os limites impostos pela Constituição à atuação judicial. Além disso, há alegações de que o STF, ao acumular funções investigativas e judicantes, pode comprometer a imparcialidade do julgamento, o que conflita com a separação de Poderes (art. 2º da Constituição).

A atuação da Polícia Federal e do STF, embora fundamentada na gravidade das denúncias, também precisa ser analisada sob a ótica da proporcionalidade e razoabilidade (art. 37, caput). A prisão preventiva de militares e as investigações sobre atos que teriam buscado subverter a ordem democrática devem respeitar as garantias constitucionais dos envolvidos. A eventual denúncia deve ser pautada em provas robustas, evitando o risco de que o processo seja interpretado como um instrumento de perseguição política.

Esse cenário reforça a importância do papel da PGR como instância responsável por analisar as evidências reunidas e decidir sobre a continuidade do caso. Ao mesmo tempo, a discussão pública sobre o indiciamento revela a necessidade de proteger os princípios constitucionais que garantem o equilíbrio entre os Poderes e os direitos individuais. O desenrolar desse processo será determinante não apenas para os envolvidos, mas também para a consolidação da democracia brasileira em um contexto de alta polarização e desconfiança institucional..