Centrão, crise política e democracia sob pressão: os 41 anos que moldam o poder no Brasil

A formação histórica do Centrão e seus desdobramentos atuais revelam um cenário de disputas políticas, críticas internacionais e desafios institucionais que colocam à prova a democracia brasileira.

Centrão, crise política e democracia sob pressão: os 41 anos que moldam o poder no Brasil

Nesta terça-feira, 12 de agosto, uma data que carrega simbolismos e remete a um marco político específico, é possível revisitar a formação do chamado Centrão, cuja origem remonta a 1984. Naquele momento histórico, o Brasil vivia a transição para a primeira presidência civil desde 1964. A composição que uniu José Sarney e Tancredo Neves para a disputa de vice e presidente não foi apenas um arranjo eleitoral, mas a costura de uma base política heterogênea que moldaria boa parte das articulações de poder nas décadas seguintes. Sarney, inicialmente ligado à direita e à Arena, partido de sustentação do regime militar que mais tarde se transformaria em PDS, acabou migrando, após uma dissidência, para a Frente Liberal, embrião do PFL. Tancredo, por sua vez, oriundo do PSD criado por Vargas, passou pelo MDB, enfrentou o bipartidarismo e participou da formação do Partido Progressista. A junção dessas forças distintas consolidou um centro pragmático que se tornou peça-chave nas negociações políticas e cuja longevidade alcança mais de quatro décadas.

Esse resgate histórico serve de pano de fundo para a análise de temas contemporâneos que atravessam a política nacional. Recentemente, um episódio nas redes sociais impulsionado por um influenciador chamado Felka expôs a ação de criminosos que buscam cooptar crianças para conteúdos de cunho sexual, uso de drogas e outras distorções. A repercussão levou figuras como a primeira-dama Janja e parlamentares a defenderem medidas urgentes de regulação das plataformas digitais, retomando um discurso que já havia sido mencionado inclusive em fóruns internacionais, como na China, sob o argumento de proteção infantil. Ao mesmo tempo, surgem críticas à seletividade dessa preocupação, lembrando que a hipersexualização de crianças na televisão brasileira remonta a pelo menos 1983, quando programas destinados ao público infantil já incentivavam gestos e comportamentos adultos em meninas. A questão, que deveria ser tratada de forma consistente e ampla, esbarra em contradições históricas e na instrumentalização política do tema.

No cenário externo, um relatório do Departamento de Estado dos Estados Unidos encaminhado ao Congresso americano acendeu alertas sobre o estado da democracia no Brasil, apontando deterioração institucional, restrições à liberdade de expressão e atuação de tribunais além de suas competências, inclusive com prisões arbitrárias e supressão do devido processo legal. O documento menciona declarações de autoridades brasileiras, como o presidente Lula, interpretadas como antissemitas, e cita nominalmente o ministro Alexandre de Moraes. Em paralelo, vereadores de Belém do Pará declararam Donald Trump “persona non grata” na cidade, num gesto político que dialoga tanto com a pauta ambiental da COP 30 quanto com alinhamentos ideológicos internos. Esses movimentos revelam a intersecção entre política doméstica e repercussões internacionais, expondo as tensões e contradições que o país vivencia.

Internamente, os efeitos políticos da prisão e da posterior prisão domiciliar de Jair Bolsonaro têm reverberado no Congresso, fortalecendo a coesão do Centrão e impondo desafios adicionais ao governo Lula. Com mais de mil decretos editados no atual mandato, o presidente tem privilegiado instrumentos normativos que evitam a tramitação legislativa e possíveis derrotas no Parlamento, mas essa estratégia traz riscos, como a possibilidade de derrubada de vetos importantes, a exemplo da lei de licenciamento ambiental. O tabuleiro político que se desenha mostra um Executivo buscando alternativas diante de uma base parlamentar instável, uma oposição que encontra novos pontos de convergência e um ambiente institucional que, embora oficialmente democrático, enfrenta críticas e pressões internas e externas sobre seus rumos e fundamentos.