STF retoma julgamento decisivo que pode mudar as regras das redes sociais no Brasil
O STF retoma hoje o julgamento que pode mudar as regras de responsabilização das redes sociais no Brasil, com impacto direto na liberdade de expressão e no controle de conteúdos ilícitos online.

O Supremo Tribunal Federal (STF) retoma nesta quarta-feira, 4 de junho de 2025, um julgamento que pode ameaçar pilares essenciais da liberdade de expressão no Brasil. Em debate está a constitucionalidade do Artigo 19 do Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014), que estabelece um importante limite à responsabilização das plataformas digitais por conteúdos de terceiros, condicionando essa responsabilização ao descumprimento de ordem judicial para remoção do material.
A sessão, prevista para as 14h, será retomada com o voto do ministro André Mendonça, que havia pedido vista do processo em dezembro passado. O julgamento já conta com três votos, revelando uma crescente tensão entre a preservação de direitos fundamentais e propostas que ampliam o poder de decisão das plataformas ou do Estado sobre o que pode ou não permanecer no ar.
O ministro Luís Roberto Barroso, presidente do STF, propôs um modelo que enfraquece a exigência de ordem judicial prévia. Em seu voto, defende a exclusão imediata, mediante simples notificação, de conteúdos relacionados a temas como pornografia infantil, suicídio, tráfico de pessoas, terrorismo e ataques à democracia. Já em casos de calúnia e difamação, admite a necessidade de decisão judicial, embora mantenha a lógica de intervenção.
Ministros como Luiz Fux e Dias Toffoli foram além, sugerindo que a simples notificação extrajudicial seja suficiente para obrigar a remoção de conteúdos considerados ilegais, incluindo discurso de ódio e incitação à violência. Esse entendimento levanta sérias preocupações sobre a possibilidade de abuso, censura prévia e a fragilização do devido processo legal no ambiente digital.
Empresas como Google e Meta, responsáveis por plataformas com bilhões de usuários, se posicionam contra essas mudanças, alertando que eliminar a exigência de ordem judicial abriria espaço para arbitrariedades e comprometeria a segurança jurídica. Essas empresas já adotam mecanismos de moderação e argumentam que alterar a regra atual pode comprometer o ecossistema da internet aberta, prejudicando a pluralidade de vozes e o direito à livre manifestação.
O julgamento tem repercussão geral, ou seja, suas conclusões irão balizar decisões judiciais em todo o país. Por isso, é acompanhado de perto por especialistas, parlamentares, defensores de direitos civis e organizações comprometidas com a defesa da liberdade online.
O debate também evidencia a lacuna deixada pela paralisação do Projeto de Lei 2630/2020, o chamado PL das Fake News, cuja tramitação estagnou no Congresso. Sem uma legislação debatida democraticamente e aprovada pelos representantes eleitos, o risco é que decisões monocráticas ou colegiadas do Judiciário acabem assumindo um papel regulatório que deveria caber ao Legislativo.
Mais do que uma disputa jurídica, o que está em jogo é o futuro da liberdade de expressão na era digital. A quem cabe decidir o que pode ser dito? Em nome da proteção contra abusos, estamos dispostos a permitir que conteúdos legítimos sejam removidos arbitrariamente? Essas são perguntas que exigem reflexão cuidadosa da sociedade.
O resultado desse julgamento poderá marcar o início de um novo ciclo no controle sobre o que circula nas redes sociais brasileiras, um ciclo que, se não for equilibrado, pode trocar a liberdade por um filtro opaco, sem transparência, nem garantias.